quinta-feira, 29 de maio de 2008

Monsanto e a ligação às raízes lusitanas




Monsanto, "a aldeia mais portuguesa de Portugal" mereceu esta designação do regime salazarista numa tentativa de enaltecer o sentimento nacionalista. E a placa ainda lá está! Mas para mim conhecer esta aldeia foi mais que isso. É um local de uma mística inesquecível o que faz jus ao nome que lhe foi atribuído de "monte santo". Eu fui lá no verão com um calor abrasador (típico daquela zona do país) mas, segundo li, é um local ainda mais bonito no inverno. Localizada num afloramento granítico que se eleva a mais de 500 m. do solo, a aldeis de Monsanto foi desde sempre um local estratégico de defesa e, simultaneamente, um local divino, ainda antes do nascimento de Portugal. É de resto um penedo que é visível a km de distância como podem ver por uma das fotos que inseri. Ao que parece, no inverno, Monsanto fica diversas vezes acima das nuvens parecendo uma ilha sobre um mar branco. A imagem que me aparece no cérebro é a de um quadro de Lima de Freitas (cujo nome não me recordo mas que parece retirada de um conto do fantástico) em que uma fortaleza repousa numa ilha que paira no céu. Enfim...
A visita a Monsanto é inesquecível e está muito bem organizada sendo-nos sugerido deixar o carro no sopé do penedo antes da entrada para a aldeia (embora algumas almas mais resistentes não o respeitem...). Assim fiz. Debaixo de 40 graus eu e a minha namorada decidimos que a experiência monsanto devia ser vivida com as pernas e com a pele. Não me recordo onde mas foi-nos dado um panfleto que sugeria 2 percursos pedestres que resultavam numa circunferência em torno da aldeia, subindo até ao castelo templário e descendo pela encosta da montanha até estarmos de novo na aldeia. Na subida passamos pelo casario de pedra que se mantém quase inalterada. As casas estavam integradas no granito da encosta e ainda eram perceptíveis algumas das pecuárias e celeiros deixados pelos primitivos habitantes deste castro pré-lusitano.
A meio caminho da encosta à porta de uma das casas de pedra estava uma senhora a vender umas bonequinhas de pano com vestidos em quadrículas vermelhas ou azuis, cuja estrutura era uma cruz, as Marafonas. A senhora explicou-nos que se tratava de um ritual com origens remotas em que as mulheres de Monsanto subiam em romaria (não católica) até à muralha este do castelo no topo da montanha apenas para atirarem as ditas bonecas para o sopé da montanha junto à capela de S. Pedro de vir-a-Corça. Este ritual foi banido pela igreja católica e as mulheres tiveram de incorporar a cruz na coisa. Ainda que muito raro esta tradição ainda é cumprida por alturas de Maio aquando as festas da aldeia. Segundo apurei as bonecas são consideradas símbolos de fertilidade: eram colocadas na cama dos noivos, na noite de núpcias (é por isso que, diz-se, não têm olhos para observar os momentos mais íntimos nem boca para os descrever...). A população atribui-lhes também a virtude de afastar as trovoadas, mau-olhado e até raposas.
Após este episódio continuámos a subida até ao castelo e monumentos limítrofes. No fim após 3 horas a andar sob um sol daqueles e com escaldões e sede, retornámos à aldeia para nos refrescarmos numa fonte de água fresca em que apetecia mergulhar.





No topo no penedo existe um planalto irregular onde se situa o castelo, uma cisterna, e umas cavidades no granito em forma de figura humana que, segundo se sabe, eram pias de sacrifícios a deuses pré cristãos. Sacrifícios humanos em que o sangue tinha especial importância já que entre cada cavidade fora esculpido um veio por onde o sangue ou unguentos deveriam correr pela montanha abaixo.
A capela da foto é a capela de S. Miguel a qual estava infelizmente fechada. Antes deste templo românico ter sido construído pelos templários existia no mesmo local um santuário ao deus Endovélico o qual era adorado pelos pré-lusitanos.

Os milénios de erosão fizeram as lajes de granito adquirir formas fantásticas.




Esta pedra gigantesta é chamada de "cabeço do velho".



Na base da montanha existe a capela de S. Pedro de Vir-a-Corça, datada do séc. XI e situada num local que se presume mágico. A capela está ladeada por carvalhos e lajes de granito imensas. Eram patentes os restos de uma festa popular que ali tinha ocorrido não há muito tempo.

Em frente da capela existe esta ermida, construída por debaixo de um conjunto de lages e tem, no seu interior, pouco mais que 2 m2. Por cima da ermida encontrámos mais das tais cavidades que havíamos visto junto ao castelo. Talvez este tivesse sido também um local de sacrifícios ou rituais.

Este local envolve uma outra lenda, segundo a qual o ermita Amador (religioso), que há muito vivia na gruta perto do campanário, encontrou um recém-nascido abandonado; sem nada para lhe dar de comer, pediu auxílio a Deus; então surgiu uma corça, que amamentou a criança até ela poder alimentar-se de frutos e ervas, a mesma dieta seguida pelo pobre eremita. Soa à lenda de Rómulo e Remo.







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